Por Ivomar Schuler da Costa – Vice-presidente do Instituto Federalista
Recentemente o jornalista Paulo Figueiredo manifestou-se acerca do federalismo americano, https://www.youtube.com/watch?v=XrxjatgI7xM&feature=youtu.be citando algumas das suas virtudes e como elas criaram condições para que aquela nação, com seu estado federal, resistissem há mais de duzentos anos, alguns destes enfrentando sérias crises. O jornalista destacou que a sua forma federal foi alterada com o tempo, de modo que entregou mais poder à União Federal, contudo, os estados-membros da federação ainda continuam com poderes suficientes para resistir e até reverter a crise atual. Referimo-nos à crise política e eleitoral durante o ano de 2020. Ele diz que a solução da crise será um indicador de caminhos para as outras nações do ocidente, tendo em vista que os EUA, durante o tempo de vigência da Constituição atual, tornou-se uma referência em democracia para os outros países.
Sem duvida, os EUA foram um modelo de sociedade, de Estado Federal, que, aliás, foi uma invenção deles, e de democracia, para todo o mundo, até o ano de 2020. No ano passado, contudo, vimos os defeitos de organização, culturais e políticos emergirem e praticamente levarem o gigante do norte à lona. É claro que esperamos confiantes que as virtudes do modelo, que era nossa referencia, possam se sobressair e não deixar aquela grande nação perecer.
A fala de Paulo Figueiredo destaca alguns pontos importantes do Estado Federal Americano que são relevantes para compararmos com o suposto estado federal brasileiro.
Analisemos as diferenças:
Ele destaca que o modelo de estado, o federal, criado pelos “pais fundadores” foi tão bom que impediu o colapso do país nos duzentos e trinta e quatro anos que se seguiram. Como a história ainda está em curso, não podemos dizer que os EUA serão abatidos, perdendo suas enormes forças: moral, política, cultural e econômica. Creio, inclusive, que as virtudes do modelo se sobressairão e permitirão a vitória sobre as forças do totalitarismo que colocou suas garras sobre o fabuloso povo norte-americano.
Por que este modelo foi tão bom? Porque as antigas colônias evoluíram para países e acabaram por constituir os próprios estados. Os estados que inicialmente se uniram para lutar pela independência contra a Inglaterra eram, portanto, países diferentes. Eles criaram uma confederação. Isto quer dizer que havia uma coordenação entre eles, mas não subordinação. Cada um mantinha a sua soberania, embora lutando juntos. Vencida a Inglaterra e estabelecida a independência, a Confederação foi mantida por meio de um tratado realizado em 1781. É importante entender que neste momento ainda não havia um estado federal, mas sim uma confederação, por isso, o nome do documento a que constituiu era “Artigos da Cconfederação”, pois era um tratado entre países, um tratado internacional.
Estes estados criaram um órgão central, mas não lhe deram poderes, isto é, numa linguagem atual, não lhe deram “competências”. Os estados tinham muito mais poderes (competências) do que o órgão central de governo, de forma que não podia cobrar impostos e, por isso, dependia totalmente dos estados signatários do tratado. O resultado foi que a organização não funcionou muito bem. Passada um pouco menos de uma década, os estados realizaram uma reunião para tratar do problema, já que desejavam permanecer unidos por causa de uma possível tentativa da Inglaterra tentar retroceder a independência deles.
A intenção inicial não era elaborar uma nova constituição. Os delegados dos estados inclusive não receberam qualquer mandato para escrever outro documento que não estivesse no escopo confederativo. Depois de quatro meses de debates, os delegados concluíram que o órgão central necessitava de mais poderes e que o sistema deveria ser diferente, deixando de ser uma confederação, com a entrega de poderes maiores à União, porém, os poderes residuais, ou seja, aqueles que não estivessem listados no novo documento seriam dos estados. Quer dizer, mesmo fortalecendo o órgão central os estados não abriam mão de reservar para si mesmos uma grande quantidade de poderes de forma que estabeleceu-se o equilíbrio de poderes entre a União e os Estados-membros.
Outro ponto a destacar é que na nova forma de organização do novo estado, os membros cederiam a Soberania e ficariam com a Autonomia. Este novo documento tornou-se uma Constituição, porque constituiu um novo estado, um estado federal. Houve um grande debate envolvendo todos os estados, porquanto, havia sido acertado que a população de cada um deles deveria aprovar o novo formato. Assim, no final, o povo acabou participando da elaboração e da aprovação da Constituição dos Estados Unidos da América.
No Brasil o processo foi muito diferente. Ainda assim podemos aprender muito com as antigas e atuais políticas dos Estados Unidos da América. A diferença é que no suposto federalismo brasileiro a maior parte do poder foi entregue à União, de modo que o que temos é, na prática, um estado unitário, em vez de um estado federal.
Alega-se que a primeira constituição da República era federalista, o que é um enorme engano. Por diversas razões podemos afirmar que não era federalista, no entanto, nos restringiremos a apontar apenas um ponto: a autonomia foi entregue aos estados, mas ao contrário do Estado Federal norte-americano, de fato não existiam garantias individuais e muito menos o eleitor poderia escolher livremente os seus representantes. Não havia, portanto, democracia, elemento necessário a qualquer sistema que se pretenda federal.
No suposto estado federal brasileiro não há equilíbrio na distribuição das competências entre os entes federais: União, Estados e Municípios. Esta é uma das razões pelas quais dizemos que o federalismo brasileiro é incompleto, e também a razão pela qual propomos um federalismo pleno, isto é, completo.
A verdade é que se os fatos que estão ocorrendo na América estivessem ocorrendo aqui, possivelmente já teríamos colapsado. Assim, precisamos reproduzir aqui as virtudes do federalismo americano, antes que seja tarde. O Federalismo pleno é um modelo para servir de guia para a reestruturação, renovação e fortalecimento da sociedade e do estado brasileiros.
Bibliografia
A Federalização das Novas Comunidades: A Questão da Soberania. Torrecillas Ramos, Dirceo . 1ª Edição. Editora Forense. Rio de Janeiro, RJ. 2004.
A Constituição Viva Dos Estados unidos: História, Textos, Retrato dos Signatários. Padover, Saul K. 2ª Edição. IBRASA. São Paulo, SP. 1987.